Clube da Matemática: projeto piloto aproxima universitários da USP de alunos da educação básica

Ao usar uma linguagem computacional, criando um ambiente em que os jovens se sentiram confortáveis, iniciativa conseguiu mostrar que a matemática é uma linguagem que permite resolver problemas do mundo real

 

Encerramento da primeira etapa do projeto foi marcado por uma visita dos alunos da escola estadual Sebastião de Oliveira Rocha ao ICMC, dia 22 de agosto. Em outubro, os encontros serão retomados. (crédito da imagem: Ana Luísa Carreira de Santiago)

 

“São aprendizados que vou levar para o resto da vida”, diz o estudante Herbert Henrique Goffredo, 12 anos, sentado em uma das mesas no hall da Biblioteca Achille Bassi, no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos. Naquele breve intervalo na agenda das atividades especialmente preparadas para a visita dos alunos da escola estadual Sebastião de Oliveira Rocha, Herbert, que está no sexto ano do ensino fundamental, foi revelando suas descobertas: “Eu não sabia como a matemática funciona, o porquê deveria fazer certa operação matemática. Quando isso ficou mais claro, eu comecei a me sair melhor na matéria. O que me ajudou bastante foi esse conhecimento do porquê e do para quê estou fazendo algo”.

Herbert foi um dos participantes de um projeto piloto realizado por professores e alunos de graduação dentro da escola estadual: o Clube da Matemática, que promoveu cinco encontros, com 1h30 de duração cada, para 40 estudantes do sexto ao nono ano do ensino fundamental durante o primeiro semestre de 2023. O encerramento da primeira etapa do projeto foi marcado pela visita ao ICMC no dia 22 de agosto. Em outubro, os encontros serão retomados.

“O nosso papel não é substituir a estrutura de ensino que já existe, mas é agregar. É uma iniciativa extracurricular para trazer certos conceitos matemáticos avançados a um terreno mais elementar, no contexto de crianças e adolescentes, de uma forma que a escola não poderia fornecer”, explica um dos coordenadores do projeto, o professor Guilherme Silva, do ICMC. “A ideia é construir parcerias de longo prazo e gerar vínculos, o que é excelente para aproximar as escolas públicas da Universidade”, acrescenta Guilherme, que organizou as atividades em conjunto com o professor Ali Tahzibi, do ICMC, e de quatro estudantes de graduação: João Pedro Cardoso de Paula e Lael Viana Lima, que cursam matemática na Unicamp; João Victor Alcântara Pimenta, que faz física computacional na USP, em São Carlos; e Luis Guilherme Coelho Bueno, aluno do curso de matemática aplicada a negócios da USP, em Ribeirão Preto.

Na opinião do professor, levar os estudantes universitários a passarem pela experiência de desenvolver um projeto na educação básica é também uma janela de oportunidade para novos aprendizados: “Um dos maiores papéis da Universidade é criar e experimentar. A gente tem que experimentar coisas novas, aprender no processo com os erros e acertos”. Por isso a proposta começou como um projeto piloto com uma turma de uma escola pública. O desafio, agora, é documentar todo o processo de forma a gerar novos conhecimentos, compartilhá-los e treinar outros estudantes de graduação, de modo que a iniciativa possa ganhar escala e alcançar mais e mais escolas.

 

“As novas gerações nasceram e cresceram com o celular na mão, se comunicando via redes sociais e internet, então, por que não fazer matemática com essas ferramentas digitais?”, indaga o professor Guilherme Silva, do ICMC. (crédito da imagem: Ana Luísa Carreira de Santiago)

 

Matemática somada à computação ― “As novas gerações nasceram e cresceram com o celular na mão, se comunicando via redes sociais e internet, então, por que não fazer matemática com essas ferramentas digitais?”, indaga Guilherme. Foi com essa perspectiva que o professor e os estudantes universitários do projeto propuseram desafios para os adolescentes usando a linguagem de programação Scratch. Criado em 2007 pelo Media Lab do Massachusetts Institute of Technology (MIT), o Scratch possui uma interface visual simples que permite aos jovens criarem histórias, jogos e animações digitais.

“A primeira vez que eu mexi com Scratch foi  no Clube da Matemática”, revelou a aluna Lavínia Baldoni Gouvea, 14 anos, que está no nono ano. “Eu não sou uma pessoa que gosta muito de matemática. Aí eu entrei no Clube e fui gostando um pouco mais. A gente foi aprendendo a programar com Scratch, e eu não sabia que na programação existia tanto da matemática. Isso tornou a matemática menos chata”, completou a estudante.

Para a professora de matemática Valéria Cristina Binoto Mendonça, que ministra aulas para os alunos do sexto ao oitavo ano na escola estadual Sebastião de Oliveira Rocha, a estratégia de usar o Scratch contribuiu muito com a aprendizagem, aumentando a motivação dos estudantes: “A matemática costuma ser o maior problema dos alunos, alguns têm medo, outros acham que nunca vão aprender. Agora, com a programação, eles estão vendo que é possível”.

No Clube de Matemática, para resolver os problemas propostos usando o Scratch, os estudantes foram estimulados a trabalhar em pequenos grupos, compostos por jovens de diferentes idades. Ao trabalhar em equipe, aprenderam também a compartilhar conhecimentos, ajudando uns aos outros.

Ao usar uma linguagem computacional, criando um ambiente em que os jovens se sentiram confortáveis, o projeto conseguiu mostrar que a matemática é uma linguagem que permite resolver problemas do mundo real de uma maneira sistemática. “Eles passaram pela experiência de resolver um problema de forma exata e de maneira aproximada”, conta Guilherme.

A proposta implementada no Clube nasceu durante as Jornadas de Pesquisa em Matemática, que aconteceram de 3 de janeiro a 10 de fevereiro no ICMC, propiciando a oito estudantes de graduação de diversas universidades brasileiras um mergulho aprofundado em uma experiência colaborativa de pesquisa. Divididos em dois times, eles atuaram em dois diferentes projetos e, um deles, que resultou no trabalho Jogos de dados não transitivos, foi a inspiração para as vivências realizadas com os estudantes da escola estadual.

O tamanho do aprendizado se manifesta nas cenas de cada encontro. Na primeira atividade, os jovens formaram grupos e jogaram dados inúmeras vezes para tentar descobrir quais as chances de ganhar quando esses dados não eram idênticos. Ao final do quinto encontro, eles já eram capazes de fazer algo impossível se não houvesse o apoio do computador: calcular as probabilidades de acerto quando os dados eram lançados 10 mil vezes.

Além dessa iniciativa piloto, diversas outras atividades de aproximação entre a Universidade e as escolas públicas da cidade estão sendo realizadas por estudantes do ICMC engajados no projeto Matemática na Medida Certa. Julia Jaccoud e José Andres Guzman Moran, ambos mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Matemática, já estão desenvolvendo atividades com estudantes da escola estadual Conde do Pinhal com o objetivo de despertar mais interesse pela matemática. Ao que tudo indica, esses são apenas os primeiros passos de uma jornada infinita.

 

“A matemática costuma ser o maior problema dos alunos, alguns têm medo, outros acham que nunca vão aprender. Agora, com a programação, eles estão vendo que é possível”, disse a professora de matemática Valéria Cristina Binoto Mendonça, que ministra aulas para os alunos do sexto ao oitavo ano na escola estadual Sebastião de Oliveira Rocha. (crédito da imagem: Ana Luísa Carreira de Santiago)

 

 

Texto: Denise Casatti – Assessoria de Comunicação do ICMC/USP

Mais informações
Conheça o projeto Matemática na Medida Certa:
https://sites.icmc.usp.br/tahzibi/dokuwiki/doku.php?id=mmc

Saiba mais sobre as Jornadas de Pesquisa em Matemática:
https://icmc.usp.br/e/fc673

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