Cresce o número de jovens que rejeitam as formas tradicionais de emprego

A procura por uma organização que ofereça condições de desenvolvimento é um ponto central na opção dos jovens por um novo emprego

Segundo pesquisa, os jovens estão mais propensos a trocar de empregos – Foto: Pixabay- Fotomontagem – Jornal da USP

 

No pós-pandemia, as formas tradicionais de emprego são cada vez menos desejadas pelos trabalhadores. De acordo com a pesquisa da consultoria americana McKinsey & Company, a vontade de trocar de emprego tem crescido entre os funcionários, sobretudo entre os jovens. O destaque do levantamento é a incapacidade das empresas e líderes em entender o que leva à insatisfação, optando por soluções temporárias, que não garantem os interesses dos subordinados.

O que os funcionários procuram?

A pesquisa acentua que os empregadores devem se concentrar nos aspectos humanos do trabalho, como a empatia e as relações interpessoais saudáveis. Entre os principais motivos de demissão mencionados, os entrevistados admitiram o sentimento de desvalorização pelas organizações (54%) e pelos superiores (52%); 51% deles também procuravam um sentido de pertencimento no emprego. A professora Graziella Maria Comini, da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP, aponta que “os resultados do levantamento estão sinalizando aspectos que já ocorriam, mas que foram evidenciados na pandemia”.

Graziella Maria Comini – Foto: FEA

Além disso, para ela, os funcionários repensaram seu vínculo com as empresas durante a pandemia: “Eles se perguntaram que tipo de ambiente eles encontram dentro das organizações”. A autonomia e a flexibilidade no trabalho tornaram-se prioridade nas características de um novo emprego, o que resulta na procura por vagas alternativas. Isso porque o ambiente do emprego tradicional é, geralmente, marcado pela carga horária definida, cumprimento de metas em detrimento da saúde do empregado e pressão por resultados.

Insatisfeitos, os trabalhadores geram um crescimento nas demissões voluntárias, a exemplo do fenômeno do quiet quitting. A professora revela que esse fenômeno não passa despercebido pelos líderes: “Não passa imune a gestores de pessoas, eles estão vendo o crescimento do desligamento voluntário, independentemente de se há alternativa”. Segundo a pesquisa, 36% dos entrevistados que pediram demissão nos últimos seis meses não tinham um emprego garantido.

A autovalorização dos funcionários também vem por meio de rejeição em uma relação tóxica com o gestor. Fatores como a comunicação violenta, pouco desenvolvimento e jornadas extensivas afastam o trabalhador de seu líder. “Isso acaba impactando a saúde física, mental. Então, você tem um monte de consequências negativas de um ambiente muito pressionado para resultado e onde você passa então valorizar esses ambientes de mais humanidade”, conclui.

Jovens

Os jovens estão mais propensos a trocar de empregos, diz a pesquisa. A procura por uma organização de referência e que ofereça condições de desenvolvimento é um ponto central na escolha desse nicho. “O grau de tolerância é zero”, afirma.

“Os jovens são mais impulsivos”, constata Graziella. Na opinião dela, a característica é negativa, pois pressiona a organização a implementar mudanças rapidamente e impede o próprio funcionário de demonstrar entrega à sua função. “A gente pode dizer então que há menos apego àquela organização e o fato das pessoas olharem para outras alternativas”, explica. Ela ainda repara uma diferença etária: “Se você for olhar alguns recortes, essa pesquisa mostra que esse fenômeno acontece mais entre os jovens do que entre as pessoas mais velhas”.

Assim, a massa de trabalhadores recém-inserida no mercado de trabalho desloca-se para organizações menores. “Surge o interesse em startups e locais de grande aprendizado, menos hierárquicos e mais horizontais”, comenta ela. Conforme a professora, o maior protagonismo nas decisões e o espaço para opiniões são comportamentos de liderança que devem ser incorporados por grandes corporações para atrair os jovens.

Homens e mulheres

Por outro ângulo, os homens demitem-se mais do que as mulheres. Esse resultado sugere que as mulheres trocam de emprego com mais planejamento e menos impulsividade do que o gênero oposto. “As mulheres têm bastante vínculo com as organizações e com o time, portanto, as mudanças são mais organizadas”, elabora a professora.

No entanto, as diferenças entre os gêneros explicita que a retração da economia, vivenciada durante a pandemia, gera mais receio e insegurança na mudança de emprego para as mulheres. “As pessoas ficam receosas, que é o fenômeno que estamos passando no Brasil hoje. E, sem dúvida, as mulheres tendem a não saírem por explosão.”

A pesquisa também exibe que as diferenças – principalmente as raciais – intensificam a falta de pertencimento na organização. Graziella informa que a amostra é internacional: “Claro que o contexto é um em cada país, isso afeta nessa decisão de desligamento ou não”. Ainda mais, ela toca novamente no âmbito de um local colaborativo e saudável para todos. “A própria pesquisa revela o quanto estão sendo priorizadas relações mais afetivas, um ambiente de maior colaboração, um ambiente mais diverso, porque isso também estimula maior inovação.”

Por Jornal da USP

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