Reflexão: O bem e o mal

Prezadas e prezados colegas da Prefeitura do Campus USP de São Carlos,

Temos a oportunidade de ler e refletir com a ajuda da filosofia oriental em duas contribuições: do conto extraído do livro “Um caminho de flores”, de Kentetsu Takamori, Editora Satry, 2012, e dos comentários do professor Mauro Nakamura, brasileiro, descendente de japoneses, que viveu e estudou no Japão.

Desejo boa reflexão!!

Professor Edmundo Escrivão Filho
Prefeito do Campus
Prefeitura do Campus USP de São Carlos

Conto

Um samurai estava viajando. Como seu criado ficara para trás, ele fez uma pausa e esperou. Por fim, o criado veio correndo, sem fôlego.

“O que estava fazendo?”, perguntou o samurai.

“Minha sandália de palha arrebentou e eu estava arrumando”.

“Quem lhe deu a palha?”

“Ninguém. Peguei de uns pés de arroz que estavam secando na beira da estrada.”

“Pediu permissão?”

“Não”, disse o criado. “Ninguém vai ligar para dois ou três caules de palha de arroz. E todo mundo faz isso o tempo todo”.

“Não admito essa atitude. Todo mundo pode permitir isso, mas eu não. Volte e peça permissão ao proprietário”, disse o samurai.

O samurai sabia que essas duas desculpas – “todo mundo faz” e “é tão pouco que não faz diferença” – estão sempre na boca do demônio.

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O senhor feudal Tokugawa Mitsukuni (1628-1701) estava numa viagem de inspeção em seus domínios. Um aldeão, famoso por maltratar a mãe, ao saber que o senhor daquelas terras recompensaria qualquer pessoa que demonstrasse respeito aos pais, e desejando receber o prêmio, carregou sua mãe nas costas e juntou-se à multidão que saudava o ilustre visitante.

Mitsukuni viu aquele homem carregando a própria mãe e mandou um auxiliar dar-lhe uma recompensa.

“O senhor não devia fazer isso”, disse o auxiliar. “Esse sujeito é famoso por maltratar a mãe o tempo todo. Ele só está aqui hoje com a mãe nas costas para tentar enganar o senhor e receber alguma coisa.”

Mitsukuni ouviu, pensativo, e disse:

“Que diferença faz isso? Mesmo que ele tenha tomado essa atitude com segundas intenções, e mesmo que seja apenas hoje, o importante é que, ao menos desta vez, ele demonstrou o devido respeito. Dê ao homem uma boa recompensa”.

Quem toca em tinta vermelha fica manchado de vermelho.

Quem se associa com gente boa sentirá um desejo natural de fazer o bem. Faça o bem, mesmo que seja só por imitação.

Comentários

Ainda vale a pena ser honesto nos dias atuais?

Com tantos escândalos de desvio de dinheiro público e outras irregularidades divulgadas pela mídia, muitas pessoas chegam a duvidar se agir sempre corretamente é a melhor postura a tomar.

Em outras palavras, não seria melhor “dançar conforme a música” e, em algumas situações, deixar de ser o “certinho” e ser mais “flexível” e esperto? Afinal de contas, “todo mundo faz” e, “é tão pouco que não faz diferença”.

Pensamentos e argumentos desse tipo estão muito mais presentes em nosso cotidiano do que imaginamos. E não se relacionam apenas ao dinheiro ou bens materiais.

Ao estacionar o carro em um local proibido ou um pouco fora da vaga do estacionamento, mesmo sabendo que isso não está correto, o fazemos com base nessas justificativas.

Mas será que realmente “é tão pouco que não faz diferença”? E, se “todo mundo faz”, mesmo algo incorreto passará a ser correto?

São indagações que precisamos fazer a nós mesmos, antes de apontar o dedo aos condenados da Operação Lava Jato.

Há um provérbio japonês que diz: “Ao ver apenas uma parte, podemos deduzir todo o resto”. Isso significa que ao ver uma ação ou atitude, podemos inferir como é a postura e o caráter de uma pessoa. Ou ainda, que a nossa personalidade está sendo constantemente construída a cada ação que praticamos, por menor que ela seja.

Não podemos menosprezar a força que cada ação praticada possui em nosso dia a dia, pois, como até a Ciência já comprovou, para toda ação sempre existirá uma consequência. Isso não se aplica apenas à Física, mas em todas as esferas da nossa vida, tanto no âmbito profissional quanto pessoal.

Todos nós cometemos erros; e não poderia ser diferente. Afinal, somos humanos. Mas precisamos ter a sabedoria e humildade de sempre nos esforçar ao máximo para plantar boas sementes, pois só assim colheremos bons frutos. Mesmo que seja só na aparência, pois isso já será o primeiro passo para uma mudança feliz.

Mauro M. Nakamura
Engenheiro e Mestre em Engenharia de
Produção pela Escola de Engenharia de
São Carlos da USP
Professor da FATEC – Faculdade de Tecnologia
do Centro Paula Souza

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