Tecnologia de impressão de microagulhas é usada no desenvolvimento de biossensores

Novo método de produção com jatos de tintas condutoras permite fabricação mais barata e em larga escala, com possibilidade de uso no diagnóstico e monitoramento de condições de saúde

Imagens ampliadas as estruturas das microagulhas impressas com jatos de tinta

As agulhas foram construídas utilizando uma substância condutora com nanopartículas de prata para a realização de testes eletroquímicos – Foto: Extraída do artigo

Microagulhas são pequenos instrumentos usados principalmente no campo da saúde para a administração de medicamentos de forma indolor. Elas também têm papel importante em áreas como a agricultura de precisão e a medicina personalizada.

Em artigo publicado na revista Scientific Reports, pesquisadores relatam o desenvolvimento de um novo método de produção de microagulhas baseado na impressão de jatos de tinta. Utilizando uma substância condutora com nanopartículas de prata, o processo mostrou ser menos custoso e mais adequado para produções em larga escala pela adaptabilidade de estruturas e materiais que podem ser usados.

Dentro do trabalho de diagnóstico e monitoramento de condições de saúde – seja para animais ou plantas –, os biossensores permitem o acesso a informações mais precisas. Eles são pequenos dispositivos utilizados para identificar substâncias presentes em processos biológicos como enzimas, proteínas e ácidos nucleicos. Ao entrarem em contato com um desses elementos de reconhecimento biológico, os biossensores são capazes de converter alterações químicas em sinais elétricos que podem ser quantificados.

Moeda de cinco centavos de euro colocada ao lado de um conjunto de microagulhas desenvolvidas no projeto.

Comparação de um dos modelos de microagulhas impressas ao lado de uma moeda de cinco centavos de euro – Foto: extraída do artigo

As microagulhas são empregadas na construção desses aparelhos, mas frequentemente exigem “processos de fabricação com várias etapas que costumam ser de alto custo”, explica Gustavo Dalkiranis, pós-doutorando na área de Termoeletricidade no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP e um dos autores do estudo. Ele conta que o trabalho buscou desenvolver impressões utilizando tintas já com propriedades condutoras, de forma que uma segunda etapa para a metalização das agulhas resultantes não fosse necessária.

Mulher adulta de cabelos escuros e longos. Usa óculos e veste um jaleco de laboratório.

Patrícia Deroco – Foto: Portal do Docente e Pesquisador Unicamp

Além do barateamento de custos pela simplificação de etapas, a produção alternativa proposta no estudo não emprega equipamentos sofisticados de impressão. “Seria igual a uma impressora que temos em escritórios, mas essa seria uma impressora industrial, em que conseguimos colocar as tintas que são de nosso interesse”, diz Patrícia Deroco.

A pós-doutoranda no Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coautora do artigo explica que as pequenas estruturas de tinta deveriam ser capazes de atingir o tecido intersticial – que preenche o espaço entre órgãos – e, a partir dele, detectar biomarcadores que refletem alterações metabólicas no organismo.

Homem adulto de barba e cabelos curtos. Usa óculos escuros e veste uma jaqueta azul marinho.

Gustavo Dalkiranis – Foto: Arquivo pessoal

Gustavo Dalkiranis descreve que, para isso, a construção das microagulhas precisava ser especializada, e um grande desafio foi a manipulação das tintas por controle de temperatura, de forma que, “conforme as gotículas de tinta caíssem no substrato, elas já pudessem se solidificar e formar essas estruturas”.

Após uma tentativa de controlar a temperatura da impressora, os pesquisadores partiram para o desenvolvimento de um sistema de aquecimento próprio. Ele permitiu o alcance de uma temperatura média e um maior controle da geometria das estruturas fabricadas.

Aplicações na pele e no futuro

A fim de verificar a eficiência da produção das microagulhas, os cientistas elaboraram um processo de testagem utilizando folhas de hortelã. A ideia, de acordo com Patrícia, era simular a aplicação das agulhas em um sistema vivo, mimetizando um tecido biológico. Para comparação, foram usados biossensores de formato plano, fabricados na mesma impressora. A pesquisadora relata que os sinais captados com os sensores em formato de microagulhas foram significativamente mais “limpos e estáveis do que os obtidos por eletrodos planos, mostrando a importância desses dispositivos em alcançar melhores informações numa futura aplicação em pele humana”.

“Uma coisa interessante é que as microagulhas não atravessaram a folha de hortelã. São estruturas tão sensíveis a ponto de causar menos danos. Isso é interessante em humanos por ser algo menos doloroso e minimamente invasivo, podendo ser usado em aplicações de monitoramento a longo prazo” – Gustavo Dalkiranis

Folhas de hortelã perfuradas pelas microagulhas do trabalho, mostrando como estas são pouco invasivas na planta.

Os experimentos realizados em folhas de hortelã mostraram a eficiência e pouca invasão das microagulhas desenvolvidas no trabalho – Foto: extraída do artigo

Para além dos bons resultados, uma outra vantagem do projeto está na adaptabilidade de estruturas que podem ser fabricadas: o uso de um software específico para a construção das agulhas permite que alterações sejam feitas facilmente. “Foram produzidas estruturas diferentes em altura, tamanho e forma. De acordo com a necessidade, você pode adaptar isso de forma muito barata”, diz o pesquisador. O uso de diferentes tipos de tinta – com metais eletroquimicamente mais estáveis, como o ouro –, também pode melhorar a qualidade da produção dos biossensores.

Essas possibilidades de variação dos materiais e layouts das microagulhas abrem novas perspectivas para a área da medicina personalizada e do monitoramento da saúde em tempo real. “Você não precisará ter a coleta de amostra justamente porque seus sensores estarão diretamente em contato com ela em tempo real”, afirma Patrícia Deroco. Os potenciais de aplicação desses pequenos dispositivos também alcançam o campo agrícola, beneficiando trabalhos como avaliação de plantas e controle de pragas.

O artigo Introducing all-inkjet-printed microneedles for in-vivo biosensing pode ser lido aqui.

Mais informações: dalkiranis@gmail.com, com Gustavo Dalkiranis, e patyderoco@hotmail.com, com Patrícia Deroco.

Texto: Fernanda Zibordi – Estagiária sob orientação de Fabiana Mariz
Arte: Simone Gomes

Jornal da USP

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