Associação entre bactérias e luz pode aumentar reação do corpo contra câncer de pele agressivo

Método usa bactérias para estimular o sistema imunológico, atuando junto da terapia fotodinâmica e destruindo células de tumores

Mulher loira, de costas, é examinada com uma lupa segurada por uma mão com luva azul, que focaliza quistos na pele

Em testes de laboratório, sob efeito da luz e do fotossensibilizador, as células de defesa do organismo “acordaram”, aumentando a capacidade de identificar e destruir células cancerígenas – Foto: Divulgação/ IFSC

Pesquisadores do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP e da Texas A&M University (Estados Unidos) demonstraram que a combinação de luz, bactérias e células do sistema imune pode ser uma arma poderosa contra um dos mais agressivos tipos de câncer de pele: o melanoma. A ideia é introduzir um estímulo ao sistema imunológico do organismo que possa eliminar o câncer mais rapidamente, combinado com o uso de terapia fotodinâmica (TFD). Os resultados do estudo, realizado em laboratório, são descritos em artigo da revista científica Photodiagnosis and Photodynamic Therapy.

A técnica de fototerapia dinâmica já é conhecida por utilizar substâncias sensíveis à luz (fotossensibilizadores) que, quando ativadas por luz de um comprimento específico, produzem espécies reativas de oxigênio capazes de matar células doentes. Mas os cientistas foram além: criaram um modelo celular que simula o microambiente tumoral, onde colocaram células de melanoma, macrófagos (um tipo de célula de defesa do organismo) e a bactéria Escherichia coli. Ao introduzirem a bactéria no ambiente tumoral, os pesquisadores verificaram uma mudança drástica no comportamento dos macrófagos. Sob efeito da luz e do fotossensibilizador, as células de defesa passaram a “acordar”, intensificando sua capacidade de identificar e destruir as células cancerígenas.

Para a pesquisadora Barbara Detweiler, pós-doutora sob a supervisão do professor Vanderlei Salvador Bagnato e autora principal do estudo, o mais surpreendente foi perceber que o sistema imune respondia melhor quando todos os componentes estavam juntos (macrófagos, bactéria e a luz ativando a fototerapia).

Outro ponto relevante do estudo foi a descoberta de que a ordem em que cada componente é introduzido no sistema influencia diretamente os resultados. Quando os macrófagos eram expostos à luz antes da infecção bacteriana, a eficácia diminuía, porém quando a exposição era simultânea, o efeito era potencializado.

A explicação pode estar no fato de que a bactéria, ao ser atacada, libera substâncias químicas que servem como sinalizadores para o sistema imune agir de forma mais precisa. Esses sinais parecem ser mais efetivos quando são liberados no mesmo momento em que o sistema imune é ativado pela luz. O ponto alto da pesquisa foi quando os cientistas reuniram o melanoma, macrófagos e a bactéria Escherichia coli. Nesse cenário, a fototerapia não só aumentou a toxicidade para as células cancerígenas, como também reduziu drasticamente sua sobrevivência, sendo que a resposta coordenada dos macrófagos foi essencial para esse resultado.

Tratamentos eficazes

Homem branco, calvo e barba grisalha. Ele usa um jaleco branco por cima de uma camisa vermelha está sentado em uma cadeira com o laboratório do fundo.

Vanderlei Salvador Bagnato – Foto: Reprodução/ Instagram

Para o professor Bagnato, coautor do estudo, que atualmente também realiza pesquisas nos laboratórios da Texas A&M University, nos Estados Unidos, o achado pode inspirar novas estratégias terapêuticas: “A complexidade do ambiente tumoral muitas vezes é ignorada em estudos simplificados”, destaca o pesquisador. “Aqui mostramos que simular essa complexidade pode levar a tratamentos mais eficazes e, portanto, tornar os experimentos um pouco mais próximos da realidade.”

Apesar de ter sido realizado in vitro, ou seja, fora de organismos vivos, o experimento relatado no artigo oferece uma base promissora para testes em modelos animais e, futuramente, em humanos.

A ideia de usar bactérias inativadas ou modificadas para instigar o sistema imunológico e torná-lo mais eficiente contra o câncer é uma abordagem inovadora, que resgata conceitos da imunoterapia do século 19, agora combinados com alta tecnologia.

Em suma, os cientistas começam a entender melhor como manipular o microambiente tumoral para tornar os tratamentos mais potentes. “O futuro da terapia contra o câncer pode estar exatamente aí, ou seja, no uso inteligente de luz, bactérias e do próprio sistema imune”, conclui Barbara.

Experimentos com animais envolvendo este novo conceito já estão em elaboração no IFSC e na Texas A&M University, relata Bagnato. “O sistema imunológico é uma arma poderosa no combate ao câncer e se pudermos realizar isto de forma natural e sem riscos para o paciente, será fantástico”, planeja.

O artigo Enhancement of activity in the Cancer immune system due to the presence of microcomponents when Exposed to Photodynamic: An in Vitro Experiment foi publicado na revista científica Photodiagnosis and Photodynamic Therapy.

Texto: Redação – Texto: Rui Sintra, da Assessoria de Comunicação do IFSC.  Adaptado por Júlio Bernardes
Arte: Gustavo Radaelli – Estagiário sob orientação de Moisés Dorado

Por Jornal da USP

VEJA TAMBÉM ...