Grupo brasileiro ajuda a recuperar textos de quase 2 mil anos dados como perdidos em biblioteca soterrada pelo Vesúvio; equipe é segundo lugar em desafio mundial

Imagem produzida durante o processo de recuperação de textos em papiros carbonizados pelo vulcão Vesúvio. Desde a descoberta, diversas máquinas e produtos químicos foram testados, o que destruiu parte do material. A técnica de desembrulhar virtualmente transforma a estrutura geométrica em imagens planas. O desafio era treinar uma inteligência artificial capaz de identificar as letras não visíveis a olho nu – Imagem: Reprodução/X/Nat Friedman
Rolo de papiro sendo digitalizado – Imagem: Vesuvius Challenge
O princípio básico do desembrulhamento virtual de pergaminhos – Vídeo: VisCente

Planta da Vila dos Papiros feita em 1908. O local ficou soterrado a 20 metros até descoberta no século 18 – Imagem: Charles Waldstei
A coleção provavelmente pertenceu a Lúcio Calpúrnio Pisão Cesonino, pai da terceira e última esposa do ditador romano Júlio César. O acervo encontrado possui centenas de rolos de papiro, de onde já foram revelados pequenos trechos de textos do materialista grego Epicuro e dos seguidores de sua tradição filosófica, os epicuristas.
A biblioteca teria sido danificada em um terremoto no ano de 62 d.C. e pelas altas temperaturas da erupção 17 anos depois. A disposição do material encontrado indica que o vulcão explodiu antes do término das reformas do primeiro desastre. “Quando os exploradores encontraram a biblioteca, não sabiam que eram papiros, acharam que eram gravetos carbonizados”, conta Elian, cujos mestrado em física computacional no IFSC deve se concentrar no uso de inteligência artificial para leitura de material arqueológico.
“Como a lava e a carbonização fundiram os papiros, algumas partes ficam muito juntas e não é possível desenrolar as folhas do jeito certo, porque outra folha que está grudada atrás e outra na frente”, detalha o pesquisador.

Um dos rolos de papiro escaneados pela equipe do desafio aberto de programação – Foto: Vesuvius Challenge
Etapa 2

Detecção de tinta em fragmento destacado por feita Stephen Parsons, aluno de pós-graduação do professor Seales – Imagem: Vesuvius Challenge
Etapa 3

Padrão de rachadura encontrado por Casey Handmer. Na figura, possivelmente um η (eta) ou π (pi) – Imagem: Casey Handmer
Etapa 4
Animação demonstrando o método desenvolvido pelos pesquisadores da USP para detectar onde havia vestígios de tinta – Imagem: Vesuvius Challenge
Como todos os competidores escolheram o mesmo rolo para trabalhar, apenas um pequeno trecho de um único rolo escaneado foi desvendado. Os primeiros colocados se destacaram por conseguir um resultado mais legível que os demais.
No entanto, as outras transcrições também contribuíram para consertar alguns equívocos obtidos pela que foi vencedora. A ideia central é que as estratégias sejam posteriormente combinadas para as próximas leituras.
“Ciência não é um esporte. Não estamos aqui numa olimpíada ou algo do tipo. A ciência é colaborativa”, comenta Odemir Bruno.
Uma grande parte da biblioteca ainda não foi escavada e a estimativa é que existam cerca de outros 2 mil rolos que podem ser encontrados no mesmo local. “Uma das expectativas com esse desafio é que as escavações sejam retomadas”, diz Leonardo. A próxima fase do concurso recebeu doações de empresários como Elon Musk, que somam hoje mais de US$ 3 milhões.
Além de Odemir Bruno, Elian e Leonardo, também compuseram a equipe premiada Raí Fernando Dal Prá, estudante de Ciências de Computação do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, João Vitor Brentigani Torezan, estudante de Física do IFSC, Daniel Baldin Franceschini, mestrando em Engenharia Química na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Bruno Pereira Kellm, estudante de Enfermagem da Universidade do Norte do Paraná (Unopar), Marcelo Soccol Gris e o americano Sean Johnson. O projeto está disponível na plataforma Git Hub.
Mais informações: e-mails elianrafaeldp@usp.br, com Elian Rafael Dal Prá; scabini@ifsc.usp.br, com Leonardo Scabini; e bruno@ifsc.usp.br, com Odemir Martinez Bruno
Texto: Ivan Conterno – Estagiário sob orientação de Fabiana Mariz e Luiza Caires
Arte: Carolina Borin – Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado
Por Jornal da USP