“Inteligência artificial reconfigura a lógica de funcionamento da sociedade”

Querendo ou não, todos precisam aprender a conviver com a tecnologia, tanto para se beneficiar dela quanto evitar os seus riscos, segundo especialistas. Evento discutiu as implicações éticas e sociais da IA

Dora Kaufman e Marcelo Finger debatem sobre inteligência artificial no USP Talks – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Ninguém é obrigado a entender como a inteligência artificial (IA) funciona, mas todo mundo precisa saber como lidar com ela. Por muitos motivos; entre eles, o de não se deixar enganar pela própria tecnologia e o de não se tornar obsoleto no mercado de trabalho. 

Essa foi uma das mensagens do último encontro da série USP Talks, que discutiu as implicações éticas e sociais da inteligência artificial, realizado no dia 30 de maio, no auditório do Instituto Moreira Salles, em São Paulo. Veja os vídeos do evento ao final deste texto.

A professora Dora Kaufman, do Programa de Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), fez uma analogia com o uso de uma tecnologia que todo mundo conhece: o carro. Você não precisa saber como construir um veículo, ou mesmo entender exatamente como ele funciona, mas precisa entender a lógica do seu funcionamento e conhecer as leis de trânsito para operá-lo com segurança — por exemplo, para saber quando pisar no freio ou no acelerador, parar, trocar de marcha, etc. 

“É um pouco nesse sentido; todos os cidadãos do século 21 precisam entender a lógica dessa tecnologia, o funcionamento dela”, disse Kaufman. Segundo ela, a IA é diferente de outras tecnologias do dia a dia no sentido de que ela não é apenas uma ferramenta, mas uma tecnologia de propósito geral, tal qual a eletricidade ou a computação, que “reconfigura a lógica de funcionamento da economia e da sociedade”.

Ela defendeu fortemente a necessidade de se criar um arcabouço legal de regulamentação da IA, e disse considerar “falacioso” o argumento de que as novas profissões e serviços gerados pela tecnologia compensarão o impacto dela no mercado de trabalho. “Do ponto de vista social, o maior impacto para mim é sobre o trabalho”, disse.

“Hoje em dia os aspectos éticos gritam tanto que é impossível deixá-los de lado”, afirmou Marcelo Finger, professor do Departamento de Ciência da Computação do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP, que também participou do evento. O ponto crucial, segundo ele, consiste em encontrar caminhos que permitam fazer um bom uso da tecnologia, sem se descuidar dos seus potenciais impactos negativos nos indivíduos e na sociedade. Uma preocupação, segundo Finger, que precisa estar presente desde os primeiros passos de desenvolvimento da IA. “Toda tecnologia tem um bom uso e um mau uso. Ela não é nem boa nem má por si; são os usos da tecnologia que acabam afetando a gente de um jeito ou de outro”, disse.

Ele ressaltou que as tecnologias de IA generativa, como o ChatGPT, “não têm nenhum compromisso com a verdade”, e portanto não devem ser usadas como “oráculos” pelas pessoas. “O ChatGPT não tem a competência para ser um oráculo; ele não foi treinado para isso, foi treinado para gerar texto”, destacou o professor, que é um dos pesquisadores principais do Centro de Inteligência Artificial (Center for Artificial Intelligence – C4AI), sediado no InovaUSP.

Clique nos players abaixo e confira.

Vídeo do debate:

 

O USP Talks é uma iniciativa da Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI) da USP, lançada em 2016, com a proposta de aproximar a Universidade da sociedade por meio de eventos presenciais em que especialistas discutem temas importantes do noticiário nacional. Os vídeos de todos os eventos anteriores estão disponíveis no YouTube, no canal do USP Talks e no Canal USP. O próximo evento será em 29 de junho, sobre o tema Racismo.

Por Herton Escobar – Jornal da USP

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