Diante do contexto preocupante das mudanças climáticas e da urgente necessidade de se inovar as formas de geração e uso de energia, dois projetos pioneiros no Brasil que usam a temperatura do solo para climatizar edifícios, em desenvolvimento na Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC-USP), avançam e já mostram sinais animadores de quanto a energia geotérmica pode contribuir e servir como alternativa.
O primeiro projeto, com a construção das fundações termoativas para climatizar parte do edifício do CICS Living Lab da Poli/USP, localizado no campus da USP em São Paulo, está em fase de obras. Essas fundações são compostas por um sistema de estacas instaladas no subsolo da edificação capazes de realizar a troca térmica, seja para captar ou para rejeitar calor do edifício no solo. Essa troca é conduzida com a ajuda de um fluido, através de tubos instalados no interior das estacas, o que permite a climatização dos ambientes do prédio.
“Já realizamos vários ensaios de performance em algumas fundações e os resultados foram animadores. Agora, aguardamos a conclusão das obras para monitorar os benefícios dessa tecnologia, transformando este no primeiro caso de edifício brasileiro com a climatização de algumas áreas feita pelas fundações termoativas”, destaca Cristina de Hollanda Cavalcanti Tsuha, professora do Departamento de Geotecnia da EESC e integrante da equipe que desenvolve os projetos.
Parceria internacional
O segundo projeto, igualmente relacionado ao uso de energia da geotérmica superficial e também com avanços importantes, trata do estudo da aplicação dessa tecnologia usando como trocador de calor com o subsolo paredes de contenção, como paredes diagrama, entre outros tipos, típicas de garagens subterrâneas, estações de metrô, túneis etc.
“Para esse projeto, estamos construindo um modelo em grande escala de um subsolo típico, com paredes de contenção em concreto equipadas com tubos trocadores de calor. Atualmente, 75% da obra já foi executada e fica no campo Experimental de Fundações do Departamento de Geotecnia na EESC”, diz Cristina.
O estudo, que tem duração prevista de 3,5 anos, faz parte de um acordo de cooperação entre a UKRI (UK Research and Innovation) / EPSRC (Engineering and Physical Sciences Research Council), do Reino Unido e a FAPESP, e conta com a parceria da Universidade de Dundee, da Escócia, e da Universidade de Leeds, da Inglaterra.
“Ao final das obras, vamos climatizar um container/escritório neste terreno e monitorar durante um ano a economia em energia elétrica com ar condicionado devido ao uso das paredes termoativas, associadas a uma bomba de calor”, explica a professora da EESC, que cita as mudanças climáticas ao tratar da relevância dos avanços dos projetos.
“Ano após ano, observamos o aumento das temperaturas, o que também faz ampliar o uso de ar condicionado nos lares e empresas. Se apenas uma parte da energia elétrica que é consumida para climatizar ambientes de edificações puder ser substituída por essa tecnologia sustentável, com recursos disponíveis em qualquer terreno, já seria uma importante contribuição para a condição crítica atual”.
Atualmente, o grupo de pesquisadores prepara os primeiros ensaios de troca térmica nas paredes enterradas no campus da EESC, que devem acontecer no decorrer deste mês de julho. “Estamos ajustando os últimos detalhes e aguardando a chegada da professora Fleur Loveridge, coordenadora do projeto pelo lado do Reino Unido. Ela passará 10 dias conosco aqui em São Carlos e acompanhará presencialmente as primeiras avaliações e testes do projeto”, diz Cristina.
Mão da engenharia
Apesar de ser pioneiro no Brasil, na Europa, o uso de estruturas enterradas no subsolo e que funcionam como trocadores de calor já acontece há alguns anos. Aqui, por sermos um país com dimensão continental, esse tipo de tecnologia traz como desafio adicional as distintas condições climáticas, o que demanda fortemente a mão da engenharia, de modo a estudar a variável de eficiência dessa modelo, de acordo com a região de aplicação.
Para Cristina, “é justamente onde entra o papel da universidade e todo o conhecimento gerado em seu ambiente, de modo a realizar pesquisas visando encontrar soluções para o uso eficiente e otimizado dessa tecnologia, que é bem sucedida em países de clima temperado, adaptada para as nossas condições de clima e subsolo, para depois viabilizá-la em benefício da sociedade”.
“A engenharia, inclusive, é fundamental no desenvolvimento, aprimoramento e implementação do uso de fontes de energia sustentáveis e limpas, e também no controle das emissões de carbono e de gases que provocam o efeito estufa. Essa área do conhecimento pode e deve fazer a diferença na sustentabilidade e no maior cuidado com o meio ambiente”, ressalta a docente da EESC. É para onde apontam os dois projetos pioneiros da universidade em andamento.
Texto: Ex-libris, para a Assessoria de Comunicação EESC