Pesquisa da USP em São Carlos analisou a relação entre a alimentação e os genes microbianos presentes no trato intestinal humano, com uso de aprendizado de máquina
Os dados de biologia molecular são naturalmente muito complexos e a análise de um único genoma é bastante complicada. “É ainda mais desafiador estudar um microbioma, que é composto de múltiplos genomas de diversos vírus e bactérias, cada um com seu material genético. Para se ter uma ideia, possuímos em nosso corpo mais genes de bactérias do que genes humanos”, comenta o pesquisador. Para driblar essa dificuldade, o estudo utilizou Inteligência Artificial e aprendizado de máquina para armazenar e processar as informações das centenas de amostras analisadas.
A pesquisa buscou investigar a presença ou ausência de genes específicos para diferenciar o microbioma dos indivíduos pesquisados. Outro objetivo era avaliar a possibilidade de manipular essa estrutura para otimizar a saúde das pessoas, com potencial terapêutico e diagnóstico.
“Partimos da hipótese de que as dietas modernas que incluem carne e agricultura comercial podem potencialmente estar ligadas a uma maior exposição a bactérias que foram submetidas a antibióticos”, explica Kasmanas. Isso também estaria relacionado com o desequilíbrio do microbioma intestinal e com a presença de microrganismos resistentes a antibióticos, como as superbactérias.
A fonte principal dos dados utilizados no estudo foram repositórios públicos, que são bancos amostrais disponíveis ao redor do mundo. Depois da coleta, as informações das amostras foram padronizadas e selecionadas seguindo critérios como idade, condições de saúde, país de origem e a dieta alimentar adotada pelo paciente, como onívora, vegetariana, vegana ou cetogênica.
Amostras de fezes humanas fossilizadas também foram selecionadas para integrar a pesquisa, para possibilitar a comparação entre a alimentação contemporânea e a pré-industrial.
Após a reconstrução dos microbiomas com algoritmos de aprendizado de máquina e análise de dados, as bactérias presentes nas amostras foram identificadas a partir de seus genes e catalogadas de acordo com a resistência a fármacos.
A comparação entre as amostras mostrou que pessoas que comiam carne, como onívoros, que consomem todos os tipos de alimentos, e cetogênicos, que ingerem pouca quantidade de carboidratos e muita gordura, apresentavam maior quantidade de bactérias com genes de resistência microbiana quando comparadas a adeptos de dietas baseadas em vegetais. Também foi encontrada similaridade entre os genes das amostras fossilizadas e das vegetarianas, o que aponta para uma potencial aproximação entre essas dietas.