Estudo inédito liderado por pesquisador do IFSC/USP aponta que memória quântica aumenta a eficiência termodinâmica

Pesquisadores brasileiros e britânicos demonstram que processos quânticos não-Markovianos podem ser usados como valiosos recursos energéticos com potencial impacto em futuras tecnologias sustentáveis

Um estudo inovador liderado pelo pesquisador do IFSC/USP, Guilherme Zambon, em colaboração com o Prof. Gerardo Adesso, da Universidade de Nottingham (Reino Unido) e publicado na prestigiada revista científica Physical Review Letters, revela que os chamados processos quânticos não-Markovianos — aqueles que “lembram” interações anteriores — são capazes de fornecer mais energia útil do que se pensava.

O que são processos não-Markovianos?

Na mecânica quântica, muitos modelos consideram sistemas que evoluem de forma “esquecida”, ou seja, sem guardar memória das interações passadas — um comportamento chamado de Markoviano. No entanto, o certo é que sistemas quânticos abertos frequentemente exibem efeitos de memória, nos quais informações podem retornar do ambiente para o sistema. Esse “fluxo reverso” de informação caracteriza os processos não-Markovianos, e agora sabe-se que eles não apenas influenciam a dinâmica do sistema, mas também podem ser explorados para gerar mais energia útil.

Prof. Gerardo Adesso

O trabalho dos pesquisadores identificou três formas pelas quais a memória quântica amplia a eficiência na extração de energia:

1-Investimento de trabalho: em vez de extrair energia imediatamente, o sistema pode “investir” energia em um momento inicial para obter um retorno maior em etapas seguintes;

2-Correlação entre tempos diferentes: processos com memória permitem que as saídas em diferentes instantes estejam correlacionadas. Isso significa que se o sistema for analisado como um todo ao longo do tempo, ele pode revelar uma estrutura energética mais rica;

3-Correlação sistema-ambiente: mesmo que o sistema isoladamente pareça desinteressante, as correlações escondidas com o ambiente, preservadas graças à memória, permitem uma extração energética mais eficaz quando exploradas corretamente;

Os autores propõem uma hierarquia de quatro estratégias para extrair trabalho de processos quânticos: sequencial, conjunta, global e, a mais geral possível, descrita pelos chamados “pentes quânticos” (quantum combs), em que as operações realizadas sobre o sistema de interesse podem carregar qualquer tipo de correlação. Em processos Markovianos, todas essas estratégias se equivalem, enquanto que em sistemas com memória, cada novo nível da hierarquia permite extrair mais energia — com vantagens diretamente relacionadas ao grau de não-Markovianidade.

Guilherme Zambon – Pesquisador do IFSC/USP

A pesquisa representa um marco ao quantificar, de forma precisa, o quanto a memória de um processo quântico pode contribuir para a eficiência energética. Neste artigo científico, Guilherme Zambon sublinha que o grupo estabeleceu uma ponte clara entre dinâmicas quânticas e tarefas termodinâmicas, algo que pode ajudar no desenvolvimento de tecnologias quânticas mais sustentáveis e eficientes. Os autores da pesquisa também sugerem que estas descobertas podem ser usadas para criar “testes termodinâmicos” que detectam memória quântica — uma ferramenta potencialmente valiosa na caracterização de dispositivos quânticos experimentais.

Próximos passos

Embora o estudo tenha se concentrado no regime assintótico — aquele em que o número de cópias dos recursos tende ao infinito — os pesquisadores planejam explorar situações mais realistas, com recursos limitados, o que pode aproximar a teoria de aplicações experimentais.

Com este trabalho, a memória deixou de ser vista apenas como um obstáculo ou curiosidade na física quântica e passou a ser reconhecida como uma aliada na busca por maior eficiência termodinâmica. Em um mundo que caminha rumo a tecnologias energeticamente conscientes, entender e utilizar essas sutilezas quânticas pode fazer toda a diferença.

Para conferir este artigo científico publicado na revista Physical Review Letters, clique AQUI.

Por Rui Sintra – Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

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